A estética da cosmética
Henrique Alves
Foto capa: Gustavo Louzada
Foto capa: Gustavo Louzada
Foto: GENILDO
Há uma contradição básica na política de incentivo da Secretaria de Estado da Cultura (Secult) nesses últimos dois anos, os primeiros em que o Fundo de Cultura do Espírito Santo (Funcultura) vigorou. Foi gasto algo entre R$ 5 e R$ 10 milhões em mais ou menos 40 editais. Feitura de CDs, peças teatrais, de dança, ópera, curtas-metragens, longa, circulação de shows musicais, entre muitas outras iniciativas. No quesito produção, os editais acertaram
Aqui deveria entrar o Cais das Artes, projeto de suntuosidade (tanto de estirpe - a Mendes da Rocha - quanto de orçamento - ultrapassa os R$ 130 milhões) e prenhe de boas intenções. Porém, perdoem, desnecessário, dispensável, rústico, supérfluo. Provinciano. Basta um tantinho de bom senso para perceber que a tal “cultura capixaba” ainda pena com problemas dos mais elementares: ator capixaba (quase) não tem onde se apresentar; músico capixaba, idem; artista plástico, idem; cineasta, idem; bailarino, idem; a cultura popular, idem; todo mundo, idem.
Principal obra em termos culturais nos últimos anos, o Cais é também o símbolo maior de uma certa elitização que tem orientado as políticas culturais capixabas. De um lado, um espaço de magnitude para receber grandes espetáculos, que serão consumidos por um público seleto; do outro, o Edtih Bulhões demolido, o Carmélia fechado, o Galpão quase lá, a Estação Porto sucumbindo ao progresso, o Teatro da Ufes inacessível, e o Carlos Gomes aberto, mas nem tanto assim (para se apresentar lá, só via um concorrido edital).
Não fossem as programações de verão ou as arenas de refrigerante da vida, você, músico capixaba, também mal teria lugar para tocar - exceções sejam feitas a projetos como o Seis e Meia, que, no Carlos Gomes, junta artistas locais e nacionais no mesmo palco, e ao Circulação Cultural, fruto de edital da Secult, que inteligentemente botou músicos capixabas para se apresentarem durante um ano pelo Estado.
Cultura popular
Apesar dos investimentos, muito pontuais, em indumentária, adereços e instrumentos musicais ou na valorização dos mestres, realizados também via editais da Secult, a um dia exuberante cultura popular capixaba atravessa uma fase de definhamento a olhos vistos. Os prêmios Renato Pacheco (para aquisição indumentária, adereços e instrumentos, destinado a grupos folclóricos) e Mestre Armojo do Folclore Capixaba (aos mestres) nos últimos dois anos distribuíram R$ 10 mil entre 60 contemplados (entre grupos e mestres).
Embora bem vindos, os prêmios não fazem jus a quem lhe dá nome (os pesquisadores Renato Pacheco e Hermógenes Lima Fonseca). É muito pouco. E o mais importante ainda está por ser feito. Nem a Comissão Espírito-santense de Folclore o fez, nem o Atlas do Folclore Capixaba, lançado em fevereiro do ano passado. A saber: uma profunda pesquisa das manifestações folclóricas capixabas.
O Espírito Santo conheceu nas últimas décadas as mais profundas transformações econômicas e sociais. No âmbito da cultura popular, porém, o impacto dessas mudanças não foi devidamente avaliado. O norte capixaba, sinônimo de pujança em termos de diversidade folclórica, é exemplo. O eucalipto da ex-Aracruz Celulose (Fibria) chegou e pequenas propriedades foram transformadas em latifúndios, o que mudou radicalmente a paisagem folclórica da região.
Muitos grupos simplesmente desapareceram. Esse abandono ficou de fora das boas intenções das políticas culturais da Secult.
Outro ponto preocupante para a produção cultural capixaba é a inquestionável influência da Vale sobre a seleção de projetos da Lei Rubem Braga. Maior recolhedora de ISS da Capital, a poluidora tem a prerrogativa de, no ato da troca de bônus, rejeitar projetos que não lhe interessem. Ou seja, acontece uma “seleção dentro da seleção”. O funcionamento da lei, baseado em abatimento fiscal, permite um tal privilégio, já que a Vale paga milhões em ISS.
Outro ponto preocupante para a produção cultural capixaba é a inquestionável influência da Vale sobre a seleção de projetos da Lei Rubem Braga. Maior recolhedora de ISS da Capital, a poluidora tem a prerrogativa de, no ato da troca de bônus, rejeitar projetos que não lhe interessem. Ou seja, acontece uma “seleção dentro da seleção”. O funcionamento da lei, baseado em abatimento fiscal, permite um tal privilégio, já que a Vale paga milhões em ISS.
Só com a Rubem Braga 2010, cujos 142 aprovados foram anunciados no início de fevereiro, a Vale já se comprometeu a investir R$ 1 milhão. Para esta edição, a lei vai injetar R$ 2,8 milhões. Duma simples regra de três, depreende-se que a Vale - sozinha - irá bancar cerca de 35% da Rubem Braga 2010. Um poder e tanto de influência.
Grandes espetáculos
O Cais das Artes foi concebido sob o argumento de “colocar o Espírito Santo na rota dos grandes eventos e espetáculos”. Argumento aceito, acolhido e festejadíssimo. É fato: as grandes realizações artísticas passam ao largo daqui; não dispomos de espaço adequado para abrigá-las. Daí nasce um mimimi generalizado sobre a marginalização cultural (& social & econômica & política) do sempre tão-perto-mas-tão-longe Espírito Santo; daí o complexo de vira-lata do capixaba atinge níveis estratosféricos.
O engraçado é que tampouco dispomos de espaços para abrigar as nossas próprias realizações. Um drama tragicômico que escancara em cores aberrantes as contradições de políticas culturais da Secult. A questão no Cais não é artística. Nem estética. A questão é cosmética. Um projeto magnânimo, de linhagem distinta, num bairro nobre, à beira da baía, em cujo cais escoarão espetáculos de bom gosto para um público selecionado.
Não pode ficar de fora também a bisonha manobra que tirou a condução das obras do Cais da esfera da Secult e transferiu-a para a Secretaria de Estado de Gestão e Recursos Humanos (Seger). Há aí um aspecto simbólico. A Era Hartung é vaidosa, almeja ser lembrada por obras marcantes - ainda que estas sejam apenas peças publicitárias bem produzidas. Daí o “novo Kléber Andrade”, o “novo São Lucas”, etc.
Na área cultural não seria diferente. Alguém aí lembra a última obra pública de grande impacto cultural? Temos para nós que é o Teatro Carlos Gomes, inaugurado em 1927, das cinzas do antigo Teatro Melpômene (este, três anos antes, fora assolado por um incêndio). O Carlos Gomes foi um marco para a cultura capixaba, nasceu num período de modernização do espaço público de Vitória (sob o governo Florentino Avidos - 1924/1928).
O Cais das Artes também quer essa honra para si. Concebido num governo que outorgou-se à qualidade de “marco histórico”, não se poderia esperar outra coisa. O Cais pretende ser um dos símbolos de um Espírito Santo (supostamente) novo.
Por isso, a condução das obras o Cais está longe da atual gestão da Secretaria de Estado da Cultura (Secult). Por isso, ela foi parar nas mãos da ex-secretária de Cultura Dayse Lemos. O Cais das Artes não pode ter o menor indício das digitais de Renato Casagrande, mesmo que seja inaugurado em sua gestão. Toda a glória a PH pertence.
ESPAÇO EM RISCO - Armazém do Porto
Foto: Paula Barreto
Muito oportuna a matéria de Marcelo Pereira, no Caderno Dois de 09/03/11. Parabéns ao jornal e aos artistas que se manifestaram.
Vitória é uma antiga cidade portuária que precisa da preservação do seu centro histórico sob pena de total descaracterização arquitetônica e urbanística se as autoridades locais não lhe prestarem a devida atenção. Os armazéns do Cais do Porto integram a beleza desse centro histórico e devem ser, o mais rápido possível, tombados pelos Conselhos de Cultura Estadual e Municipal. É o que lhes cabe fazer para proteger Vitória dos que desconhecem a nossa história ou a desconsideram.
Além de integrar um conjunto arquitetônico da década de 1920 o Armazém 5 já é conhecido como point cultural, tendo sediado o muito bem visitado 7º Salão do Mar, em 2006. Sediou, também, a Estação Porto com muito sucesso e agora acolhe os inúmeros turistas que chegam a Vitória pelo mar. Como derrubar um prédio com essa história? Esse prédio só pode ser descartável para quem não é capixaba, nascido ou de coração.
Os que pensam que todos os espaços da cidade têm sempre que gerar lucro deveriam saber que cultura e turismo também geram dinheiro e podem dar lucro. Para se verificar as inúmeras possibilidades econômico-turístico-culturais de antigos armazéns é só visitar, aqui mesmo no Brasil, os galpões do Porto de Belém do Pará, com suas lojas, cervejaria, restaurantes, lanchonetes, espaços para shows, anfiteatro, teatro e porto para passeios turísticos; o Porto do Rio de Janeiro, com armazéns dotados de salões muito bem equipados de embarque e desembarque para turistas, lojas de marcas conhecidas e de souvenires, restaurante, cafeteria, além de serviço de táxi e de vans. Já em Recife o Cais do Porto vai ser revitalizado e seus galpões serão reformados a partir de 2011. O Governo de Pernambuco vai investir cerca de R$ 25 milhões para reformar o local e os armazéns serão transformados em lojas, restaurantes, teatros, espaço para eventos e centro de artesanato. Um deles receberá o Museu Cais do Sertão Luiz Gonzaga, que custará R$ 26 milhões e receberá investimentos do governo federal. Fora do Brasil vale uma visita às Docas de Alcântara, em Lisboa, para se verificar o bom aproveitamento de antigos armazéns de cais que já não servem para os portos modernos, mas são perfeitos para a indústria cultural e a turística.
Resumindo, a Codesa precisa lembrar-se que "Atrás do Porto Tem uma Cidade" (como no titulo da maravilhosa exposição de Eder Santos, no Museu Vale). E acrescento: tem uma cidade com vida, com cultura, com história, com gente; e existem muitos outros locais no litoral, certamente mais adequados para a construção de uma retroárea de armazenamento, sem cidades antigas por perto.
Maria Helena Lindenberg
Museu do Pescador promove tradição
FOTO: BECO CULTURAL
Conhecido popularmente como Museu do Pescador, o Museu Histórico da Ilhas das Caieiras "Manoel dos Passos Lyrio", denominado assim por meio da Lei nº 6.306, é uma antiga reivindicação da comunidade e se constitui como um museu comunitário.
O museu é uma obra do Programa Terra Mais Igual, na Ilha das Caieiras, Poligonal 12. O espaço é gerenciado pela Secretaria Municipal de Cultura (Semc).
Os moradores de toda a região podem contribuir para a criação de um acervo interativo. Sua gestão e suas atividades serão desenvolvidas com o envolvimento da comunidade, de forma que esta se aproprie do museu e contribua para o seu crescimento.
Voltado principalmente para a relação dos moradores com o mar e o manguezal, já que a região é rica na tradição das famílias de pescadores, o Museu Histórico da Ilha das Caieiras "Manoel Passos Lyrio" busca fortalecer a identidade local.
Para se manter ativo, o Museu Histórico da Ilha das Caieiras "Manoel Passos Lyrio" irá promover diversas atividades para o público visitante, priorizando monitoria, envolvimento da comunidade, preservação da memória, difusão cultural e pesquisa. Além disso, boa parte do seu acervo será proveniente do encontro com os moradores locais, que poderão abastecer o espaço com objetos e até depoimentos.
Manoel Passos Lyrio
Nascido em Santa Leopoldina , Manoel Passos Lyrio foi um dos primeiros moradores a aportar na Ilha das Caieiras, em Vitória. Pai de cinco filhos e casado com Anna Teubner, chegou à região em 1927, numa pequena canoa vindo pelo rio Santa Maria. Em 1937 adquiriu um terreno e construiu sua residência própria, onde também instalou um comércio de secos e molhados, conhecido como "a venda do seu Duca". Neste mesmo local funciona o Museu Histórico da Ilha das Caieiras "Manoel Passos Lyrio". Em 1940 o sobrado foi inaugurado com o primeiro baile de carnaval no andar superior, tornando-se uma referência para toda a comunidade.
Onde fica o Museu
Endereço: Rua Felicidade Correia dos Santos, s/n, Ilha das Caieiras, VitóriaHorário de funcionamento: segunda a sexta-feira, das 13 às 17 horas.Informações: (27) 3132-8372 e 3132-5295.